quarta-feira, 14 de junho de 2023

QUEM É GUSTAVO LIMA PRA DERRAMAR O MUGUNZÁ DE FLÁVIO JOSÉ?

 


*Por Alana Freitas El Fahl

Vamos direto ao assunto: Acho que a culpa nem é dele, é de quem contrata essas atrações para as festas juninas, não só o rapaz em questão, mas tantos outros nomes que não deviam tocar nesse matulão que é do forró, xote, maracatu e baião. Mas aí, seu menino, você mexeu com coisa sagrada, tome juízo. Respeita, Januário! Luiz Gonzaga, Dominguinhos e Flávio José é minha Santíssima Trindade do forró e creio que de muita gente que também aprecia o gênero. Dois no céu, outro na terra.  Uma pra mim, outra pra mim, deixa pra tu também. 

Olha pro céu, meu amor! Com tantos outros santos e arcanjos já por lá e por cá como Genival Lacerda, Cremilda, Marinês, Amelinha, Alcymar Monteiro, Virgílio, Adelmário Coelho, Dorgival, Quininho de Valente, Nando Cordel, Trio Nordestino, Waldonys, Jorge de Altinho, Santana, Targino Gondim, Chambinho, Lucy Alves, Dorgival e Cia, sem contar os incontáveis "trios pés de serra" que resistem na base de tareco e mariola e tantas estrelas ainda buscando seus espaços, o que não falta é gente boa para ser contratada nesse período específico e que exige música tradicional da época. Essa turma já fatura alto o ano todo, de janeiro a janeiro.

Se a razão das contratações é chamar mais gente, o público que só curte quem está no estrelato dos milhões, que só gosta dessa turma, eu discordo, acredito na formação de novas plateias sempre através do contato e exposição. Alguém chama os forrozeiros para tocar no carnaval? Alguém chama os forrozeiros para o Festival de Verão? Simone canta " Então é São João"? Perguntas retóricas...Vou tomar de empréstimo o Paulinho da Viola que também não tem nada a ver com a história, mas duvido que aceitasse um convite para cantar no São João. "Tá legal eu aceito o argumento, mas não mude o forró tanto assim"...

Meu protesto é muito pouco é quase nada, mas não tem outro mais bonito no lugar...Ave, Flávio! Você é que nem avelós, mas tem que ter voz! A música pacifica o mundo!

Alana Freitas El Fahl é professora de Literaturas Portuguesa e Brasileira e fã de Flávio José.

segunda-feira, 5 de junho de 2023

JORJÃO, O REPÓRTER FURÃO

 


Por Cristóvam Aguiar

Jorjão era o melhor repórter do jornal “A Trombeta”, o independente e intimorato semanário da cidade de Brasilônia, município encravado no coração do sertão aonde nem notícia ruim chega. Cidade pacata, mas um tanto surrealista. Talvez o único lugar do mundo onde, embora detentor das maiores plantações de mandioca, era obrigado a importar álcool para abastecer os seus veículos, simplesmente porque era proibido fabricar álcool no município. Coisas dos governantes de Brasilônia, que não compete a nós, pobres mortais, discutir nem discordar.

O coronel Durval Martins Falcão de Carvalho, homem poderoso do lugar, tido e havido como verdadeiro dono do município, tinha um fraco: era viciado em sexo. Na sala de sua casa, sua espada, conquistada com honras e glórias nos tempos do exército, fora colocada na parede da sala com a ponta voltada para cima, qual verdadeiro símbolo fálico.

Seguia Brasilônia a sua vidinha pacata, com a rotina quebrada vez ou outra por alguma festa, eleições ou algum crime bárbaro. Jorjão, o repórter do “A Trombeta”, jornal que o coronel costumava qualificar como “imprensa marrom”, sonhava com uma grande matéria que lhe desse notoriedade e, quem sabe, rendesse um convite para trabalhar num grande jornal da capital.

Ansiando pela oportunidade que não vinha, vez por outra ia à igreja matriz para pedir a Nossa Senhora dos Desafortunados, uma chance, uma inspiração que o levasse a realizar a tão sonhada reportagem. Certo dia, ao entrar na igreja, postou-se de joelhos perto do altar e estava imerso em suas orações quando ouviu uns gemidos. Olhou em volta, mas a igreja estava vazia. Os gemidos, percebeu, vinham da sacristia.

Aproximou-se silenciosamente e qual não foi a sua surpresa quando, ao afastar um pouco a cortina, flagrou o coronel Durval em pleno coito anal com o padre Bedel, o pároco local. Imediatamente, em absoluto silêncio, Jorjão sacou sua câmera equipada com teleobjetiva e, “click”, fez a foto. Correu para o jornal e preparou aquela que seria a grande matéria da sua vida.

Texto pronto, foto revelada, mostrou ao editor que vibrou com a notícia. Imediatamente mandou “parar as máquinas” e convocou todos os funcionários para trabalharem numa edição extra. Mas havia um porém. Como dar a manchete de tal fato, sem chocar a tradicional família brasilônica? O título não poderia ser uma coisa grosseira. Teria que ser colocado de um modo suave, para não ferir a moral os bons costumes daquela boa gente.

No dia seguinte, estava a edição da “Trombeta” nas ruas, com a seguinte manchete, em letras garrafais: “Membro militar penetra em círculo eclesiástico”.

Crônica publicada no livro A Levada da Égua e outras estórias (2004)

domingo, 4 de junho de 2023

O POEMA DOMINGUEIRO DE JOZAILTO LIMA


ÂMAGO


do chão da casa antiga,

o umbigo escala paredes

sobe ao telhado

confisca o sol da fatal primeira hora

e o reelabora em luz da vida inteira.

 

no chão antigo, decifro a casa

larga.

larga e derradeira.


Jozailto Lima/Ilustração, Ronaldson

(Do livro “Ainda os lobos”, editora Patuá, São Paulo, 2016).